quinta-feira, 6 de março de 2008

Sobre Mensagem

Mensagem (1934)

Fernando Pessoa foi sempre movido pela consciência de ser o intermediário entre o divino e a humanidade e que uma missão, recebida, lhe cumpria desempenhar. Esta consciência move-o no seu percurso literário e culmina, amadurecida e trabalhada, na publicação, em 1934, da sua obra Mensagem. O seu patriotismo desde cedo se fez notar. Quando regressa a Portugal, a pátria abandonada durante cerca de 10 anos, a pátria onde o pai e as memórias da infância feliz ficaram sepultadas, depressa lhe surgem diversos projectos de índole patriótica, a realizar por intermédio da intervenção literária na vida portuguesa. Estes projectos manifestam-se logo com a sua adesão à Renascença Portuguesa e culminam com a reunião e conclusão dos poemas de Mensagem, publicada pouco antes da sua morte, obra que o poeta encara como fruto de uma missão patriótica e universalista. Nesta obra, cujos poemas foram escritos entre 1913 e 1934, está bem patente o seu ideal patrótico, sebastianista e messiânico e a crença na condução divina dos destinos da humanidade e da história: Deus quer, o homem sonha, a obra nasce (Parte I, O Infante). Em Mensagem, o cruzamento dos percursos espiritualistas, ocultistas e míticos de Fernando Pessoa reunem-se para a apresentação de um Portugal eleito por Deus, um Portugal decadente mas que deverá constituir-se novamente como um Império, desta vez do espírito e da cultura, ideia profética e mítica que o poeta desenvolve ainda no poema Quinto Império, onde também aí visiona o surgimento de Portugal como um Império (depois de Grécia, Roma, Cristandade e da Europa) não material,mas da cultura e do espírito. Para a regeneração de Portugal, para levantar o espírito da nação, Fernando Pessoa é consciente do papel da difusão dos grandes mitos. Parte, então, do mito de D.Sebatião, que, desaparecido no nevoeiro, tal como o Rei Artur, haveria de regressar para que Portugal se cumprisse de novo: Vem, Galaaz com patria, erguer de novo/...Mestre da Paz, ergue teu gládio ungido, /Excalibur do Fim, em grito tal/ Que sua luz ao mundo dividido/ Revele o Santo Graal.( Parte III - O Desejado). A obra estrutura-se em três partes: O Brasão, O Mar Português e O Encoberto.

Na primeira parte, Fernando Pessoa percorre, através de figuras da nossa história (Viriato, O Conde D.Henrique, D.Teresa, D. Afonso Henriques, D.Dinis, D.João I, D.Filipa de Lencastre, D.Duarte, D.Fernado, D.Pedro, D.João, Infante de Portugal, D.Sebastião, Nunalvares Pereira, O infante D.Henrique, D.João II e Afonso de Albuquerque), emissários e heróis ao serviço da vontade divina, a história de Portugal, a formação da nação portuguesa, sempre com a ideia de uma condução histórica que parte, não da vontade dos homens mas, dos desígnios divinos: Todo o começo é involuntário/ Deus é o agente / O herói a si assite, vario/ E inconsciente. (Parte I - O Conde D.Henrique)

Na segunda parte traça o percurso grandioso da epopeia épica dos portugueses, bem como a preço a pagar pela universalidade conquistada por este povo, entrevendo, desde já, a posssibilidade de regeneração deste país que entretanto se adormeçeu: Senhor, a noite veio e a alma é vil./ tanta foi a tormenta e a vontade! / Restam-nos hoje, no silêncio hostil, / O mar universal e a saudade / Mas a chama, que a vida em nós criou / Se ainda há vida ainda não é finda./ O frio morto em cinzas a ocultou./ A mão do vento pode ergue-la ainda (Parte II- Prece)

Na terceira parte afirma a possibilidade de uma regeneração de Portugal através da força do mito: É O que eu me sonhei que eterno dura, / É Esse que regressarei (Parte III, D.Sebastião). Consciente da decadência e estagnação do país, o poeta acredita na possibilidade de Portugal voltar a constituir-se como um Império: Tudo é incerto e derradeiro./ Tudo é disperso, nada é inteiro./ Ó Portugal, hoje és nevoeiro.../ É a Hora! (Parte III- Nevoeiro).

Em Mensagem manifesta-se igualmente o simbolismo esotérico a que Fernando Pessoa recorre em algumas das suas poesias.É o próprio poeta que a designa como um livro tão abundantemente embebido em simbolismo templário e rosacruciano (Páginas Íntimas e de Auto-Interpretação, p.434). Desde logo, a estrutura tripartida
. da obra remete para o esoterismo, sendo, como é sabido, o número três um número carregado de simbolismo esotéricos. Não só a obra é dividida em três partes, como, por exemplo, a última parte (O Encoberto) é ela mesma estruturada segundo este esquema ternário (Os Symbolos, Os Avisos e Os tempos). As restantes subdivisões da obra correspondem igualmente a uma estrutura numerológica esotérica, através dos números 5, 7 e 12. A primeira parte da obra (O Brasão) é subdividida em 5 partes, e cada uma subdividida num daqueles números; a segunda parte (O Mar Português) é formada por 12 poemas e na terceira parte, cada uma das três subdivisões já mencionadas é, por seu turno, subdividida, respectivamente, em 5, 3 e 5 partes. Além da numerologia, vários símbolos esotéricos se fazem notar ainda na obra: a tradição esotérica dos Templários bem como o sombolismo rosa-cruciano. Fernando Pessoa concorreu em Outubro de 1934, com esta obra, ao prémio Antero de Quental, do Secretariado da Propaganda Nacional, destindado a premiar uma obra de índole nacionalista. O primeiro prémio foi atribuído a Vasco Reis, mas o júri, presidido por António Ferro, decidiu elevar a quantia atribuída ao segundo prémio. Esta obra, que é geralmente considerada como a expressão do nacionalismo português é lida como uma obra universalista, tal como quase toda a obra pessoana, por estudiosos de inúmeros países. O seu carácter universalista, que o próprio Fernando Pessoa lhe atribuia, não tardou, pois, a ser-lhe reconhecido.

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Mensagem

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